Oito agentes, dois escrivães e cinco delegados atuam na maior investigação do país. Para chefe da operação, trabalho será herança para a instituição
Grupo de elite - delegados Felipe Hayashi, Igor Romário de Paula e Érika Marena investigam a operação Lava Jato - VEJA
Em setembro de 2013, o delegado Márcio Adriano Anselmo fez à
Justiça um pedido de quebra de dados telefônicos de um interlocutor
identificado apenas como “Primo”. Pouco depois, o tal “Primo”, apelido
pelo qual era conhecido nas empreiteiras, se revelaria o doleiro Alberto
Youssef, um dos maiores operadores do país e pivô do esquema
investigado pelos policiais. Da prisão de Youssef
em São Luís, no Maranhão, em 17 de março do ano passado, à detenção do
ex-diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró, na última
quarta-feira, passaram pelo rastreamento da equipe de policiais federais
mais de 10 bilhões de reais movimentados ilegalmente por 88 réus
denunciados à Justiça, no maior esquema de corrupção da história
contemporânea do país. E isso ainda está longe de acabar.
A Operação Lava Jato
prendeu um clube de milionários da construção civil, com a maioria das
acusações reconhecidas, até o momento, pelo Supremo Tribunal Federal
(STF), um exemplo raro de consistência de inquéritos policiais. Na base
disso está um time de 15 policiais considerado nos corredores da
instituição como um “grupo de elite” de combate à corrupção.
“Contamos com um núcleo de policiais que estão altamente
comprometidos e cada dia mais especializados em investigação de
corrupção. Ao final desse caso, vamos ter contribuído para formar na
Polícia Federal um time de elite no que concerne a investigações dessa
natureza. É gratificante isso. É um caso que nos força a estudar e
evoluir a cada dia”, afirmou a delegada Erika Marena, chefe da Delegacia
de Combates aos Crimes Financeiros de Curitiba.
Erika foi indicada ao comando pelo delegado Igor Romário De Paula,
empossado na Delegacia de Combate ao Crime Organizado em abril de 2013 e
ex-chefe da mesma unidade em Alagoas. Naquele momento, apenas o
delegado Márcio Anselmo, nascido em Londrina, e dois agentes se
dedicavam à apuração. Ao descobrir o envolvimento do também londrinense
Youssef, o delegado Anselmo rapidamente percebeu que tinha esbarrado em
um grande esquema de lavagem de dinheiro. O caso mudou de tamanho e
precisou de reforços. De lá para cá o grupo aumentou e conta com uma
equipe fixa de 15 policiais – oito agentes, dois escrivães e cinco
delegados.
A Operação Lava Jato agitou o mundo político, com a descoberta do
envolvimento de governadores, senadores e deputados federais no esquema
de corrupção. Transformou também a rotina no corredor do segundo andar
da Superintendência da PF em Curitiba, onde trabalham os policiais do
caso. Foram abertos mais de 250 procedimentos para investigar o esquema
de corrupção da Petrobras e as diferentes ramificações criminosas da
atuação de doleiros e funcionários públicos.
A apuração deixou de ser limitada às negociatas da estatal do
petróleo, chegou ao setor elétrico e já esbarra no frigorífico JBS.
Diante da afirmação do delator e ex-diretor de Abastecimento da
Petrobras Paulo Roberto Costa, de que o esquema era reproduzido em todos
os órgãos públicos, não se sabe quando e onde a investigação vai
acabar. Uma planilha apreendida no escritório do doleiro listava quase
750 projetos em que a quadrilha de Youssef indicava ter atuado.
Diante de um esquema internacional de lavagem de dinheiro, não foi
tarefa fácil. A vinculação de Youssef com a Petrobras só foi descoberta
quando foi achada a comprovação de que ele tinha presenteado o
ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa com uma
Land Rover avaliada em 300.000 reais. As apreensões na casa do
ex-diretor, indicado pelo PP ao cargo em 2004, demonstrariam as inúmeras
negociatas na Diretoria de Abastecimento – que chegaram a envolver
duas filhas e dois genros de Costa no esquema.
Braços – A cobrança de propina por facilidades na
Petrobras era especulada há anos no mundo empresarial. A Operação Águas
Profundas, de 2007, chegou a prender funcionários da estatal e
empresários por fraudes na licitação de plataformas. O delegado Felipe
Hayashi, da equipe de Erika Marena, investigava, desde 2011, suspeitas
de fraudes em obras da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), em
Araucária, no Paraná. Mas as provas apreendidas na operação fecharam o
quebra-cabeça pela primeira vez, com identificação de corruptores,
corruptos e intermediários. Em um dos endereços de Youssef, foi
encontrado um contrato fictício da Mendes Júnior com empresas de fachada
do doleiro. Depois de preso, o vice-presidente da empreiteira, Sérgio
Mendes, veio a admitir que pagou cerca de 8 milhões de reais a Youssef,
mas alegou ter sido vítima de extorsão. A ação penal já está em
andamento na 13ª Vara Federal do Paraná, do juiz Sérgio Moro.
Hayashi e o delegado Eduardo Mauat, ex-chefe da Delegacia de Combate a
Crimes Financeiros de Florianópolis, tocam a maioria dos novos
inquéritos da Operação Lava Jato, que investigam de fundos de
pensão, empreiteiras e inúmeras empresas de fachada. Com De Paula,
Anselmo e Érika, eles se revezaram na tomada dos depoimentos dos
acusados que fecharam acordo de delação premiada. Acompanhados pela
força-tarefa do Ministério Público Federal, interrogaram Costa, Youssef,
o lobista Júlio Camargo, o empresário Augusto Mendonça Neto e o
ex-gerente de Serviços da estatal Pedro Barusco, além de outros sete
delatores.
Como o resto da equipe, Hayashi é um estudioso de direito
internacional e defende melhoras legais para o combate à corrupção. Ele
defende a criação e o treinamento de grupos especializados no combate a
esse tipo de crime em outras áreas do setor público. “A corrupção é
impossível de acabar. Mas podemos minimizar, prevenir e combater. Um
ponto importantíssimo é aquilo que a convenção de Mérida prevê, de
especializar autoridades encarregadas de combater esse tipo de crime.
Policiais, procuradores e juízes precisam estar capacitados para
desenvolver suas funções de forma eficaz”, afirmou.
De Paula, coordenador de toda a estrutura logística da operação,
avalia que a Lava Jato só alcançou resultados tão amplos porque foi
objeto de trabalho de policiais especializados, de um grupo de elite do
Ministério Público Federal e do juiz federal Sérgio Moro, especializado
no tema. “Temos uma situação aqui no Paraná hoje muito favorável, com
todas as autoridades com conhecimento no assunto, nenhum tipo de
comprometimento político e efetivamente comprometidos com os
resultados”, afirmou.
Banestado – Como o juiz Sérgio Moro e quatro
procuradores da força-tarefa, Anselmo e Érika também trabalharam nas
investigações no caso Banestado, esquema pelo qual mais de 28 bilhões de
dólares foram remetidos ilegalmente ao exterior. Foi justamente neste
escândalo que o doleiro Alberto Youssef ficou famoso, como um dos
principais operadores presos. Ele fechou acordo de delação premiada
pelos crimes cometidos no Banestado, celebrado com os mesmos
procuradores e o mesmo magistrado da Lava Jato. Youssef entregou
inúmeros clientes à época e contribuiu com as investigações, mas quebrou
o acordo e continuou no mercado paralelo, o que reabriu processos do
Banestado e deve complicá-lo ainda mais em nova condenação.
Depois de um ano de resultados e o trabalho ainda “no início”, o
delegado De Paula traçou um planejamento de alocação material e
profissionais na Lava Jato até o começo de 2016, diante da magnitude dos
crimes em investigação. “Estou fazendo planejamento semestral e anual
,para obter reforços e recursos para essa operação até dezembro. Estou
vislumbrando que teremos trabalho para 2015 inteiro”, afirmou.
Fonte : Revista Veja
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